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David Mourão-Ferreira

Letristas - Actualizado em Setembro 13, 2021
Figura cimeira da vida literária portuguesa do século XX, David Mourão-Ferreira conquistou o público.

"Em qualquer parte do mundo aonde o desejo ou as circunstâncias me têm arrastado – do Brasil ao Japão, dos Estados Unidos à União Soviética – , basta alguém saber que sou português para de imediato saltar a terreiro o nome de Amália. E, se acaso por acréscimo vêm também a saber que Amália Rodrigues interpreta uma dúzia e meia de letras da minha autoria – e entre elas o Barco Negro – então aí logo fico todo a cintilar, imerecido satélite, da luz reflexa do seu nome e renome."  David Mourão-Ferreira (1927-1996)

Com as suas próprias palavras, de amizade e orgulho sentido, David Mourão-Ferreira ilustra o que se viria a tornar um marco não só na sua vida, mas também no Fado e na cultura portuguesa: as suas colaborações como letrista de Amália Rodrigues, a repercussão dessas colaborações e, finalmente, a dimensão que essa produção artística adquiriu.

Na verdade, o seu percurso como poeta (e também ensaísta, ficcionista, crítico literário, tradutor e dramaturgo) iniciou-se ainda na faculdade – o primeiro livro de poesia, A Secreta Viagem, data de 1950. David era ainda aluno da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, por volta de 1952-53, quando conheceu Amália e surgiram as primeiras letras de fado, dele para ela:

"Mas que surdo e raivoso burburinho, nas hostes literatas e politicastas, quando comecei a escrever versos para Amália cantar!"

O jovem promissor, que começava a afirmar-se sobretudo como poeta e que participava de forma activa na vida literária portuguesa, decide enveredar por um caminho até aí estranho e desconhecido dos seus parceiros das lides literárias, maioritariamente progressistas.


Do feliz encontro, que mais tarde se tornaria um encontro a três (no qual se incluía também Alain Oulman) surgiu uma série de poemas para Amália interpretar como só ela sabia, e ainda aquele que ainda hoje é considerado um dos melhores discos de Fado de todos os tempos: Busto (1962). Nos seus versos, plenos de emotividade e intimismo, David Mourão-Ferreira recriava, descrevendo como ainda ninguém tinha feito até então, os temas fulcrais do Fado: o Amor, a Saudade, a cidade de Lisboa. A sensibilidade de Amália Rodrigues deixou-se imediatamente tocar pelas palavras do Poeta, e assim assistimos ao estabelecimento da mais vasta produção poética de um autor para a Diva do Fado (David Mourão-Ferreira foi o mais cantado por Amália, a seguir a ela própria).

E foi exactamente através dos fados que escreveu, que David Mourão-Ferreira conquistou o reconhecimento não só dos círculos literários lisboetas, mas sobretudo do povo português (e também de todos os estrangeiros que tomaram contacto com a obra de Amália).

O seu papel relevante como figura da Literatura Portuguesa do séc.XX é inegável, tendo em conta o extenso legado que deixou – no qual se incluem 14 livros de poesia, 6 de ficção, 2 de teatro e 16 obras como ensaísta e crítico – e os onze prémios que lhe foram atribuídos, nas diversas áreas em que se demarcou. No entanto, David Mourão-Ferreira chegou a todos os portugueses através da Maria Lisboa, da Madrugada de Alfama, da Primavera, do Abandono, do Barco Negro, …, conquistando assim a Imortalidade reservada aos que sabem inculcar, na alma de cada português e no património de todos, a sensação visceral de nos sentirmos nós próprios, neste Lugar e neste Tempo. 


Fados escritos por David Mourão-Ferreira:

  • Abandono (fado peniche)
  • As águias
  • Anda o sol na minha rua
  • Au bord du Tage
  • L'automne de notre amour
  • Aves agoirentas
  • Barco negro
  • Em Aranjuez com o teu amor
  • Espelho quebrado
  • Libertação
  • Madrugada de Alfama
  • Maria Lisboa
  • Neblina
  • Nome de rua
  • Primavera
  • Quando a noite vem
  • Sempre e sempre amor
  • Solidão
  • Sombra
Patrícia Costa (colaboração de Catarina Rocha)



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Comentários
#1 Paulo Valente 2009-12-13 15:57 Os poemas de David Mourão-Ferreira cantados em Fado não são um exclusivo de Amália Rodrigues. Nas décadas de 1960/70, outros fadistas gravaram poemas seus, como é o caso do "Varandas", gravado por Mercês da Cunha Rego, no Fado Franklin. Francisco Pessoa gravou um EP, intitulado "Quatro Fados de Amor com letras de David-Mourão Ferreira". São eles "Não foi nada", "Fado das Quatro Estações" (Dois Tons), "À noitinha" e "Ponto Final". Curiosamente a contracapa do disco apresenta um texto assinado pelo próprio poeta. Citação
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