É uma casa portuguesa com certeza!
Bem aos pés de Alfama (o lugar
certo) aquele edifício em tons de vermelho convida-nos a entrar para
ver, ouvir e... sentir (sobretudo sentir) o fado... É o Museu do
Fado e da Guitarra Portuguesa, onde hoje "habitam" inúmeros artistas
portugueses, desde fadistas a instrumentistas, passando por poetas,
que, de uma forma ou de outra, deixaram a sua marca na lusitana paixão.
Amália
Rodrigues, António Pinto Basto, Argentina Santos, Alfredo Marceneiro,
Fernando Maurício, Carlos do Carmo, Camané, Maria da Fé, Mafalda
Arnauth, Mariza, Maria Teresa de Noronha, António Chainho, Mísia,
Domingos Camarinha, João Linhares Barbosa, Frederico de Brito e tantos
outros abrem-nos as portas de "sua casa" e convidam-nos a fazer uma
viagem histórica pelos meandros do fado, do amadorismo à
profissionalização.
E de repente, é como se alguém pedisse Ó
Tempo Volta para Trás. E ele volta. Até ao século XIX, onde o fado era
cantado nos bairros históricos, como o que está representado na maqueta que
se encontra na primeira sala da exposição. E lá estão o aguadeiro, o
magala, a prostituta, a bisbilhoteira, a vendedora de sardinhas e, é
claro, a taberna, local obrigatório para se cantar o fado... amador.
E é ao som da guitarra de Armandinho que a réplica da
taberna construída com base na gravura Os Fadistas, de Rafael Bordalo
Pinheiro, ganha vida. É em espaços como este (mesas em madeira com
tampo de mármore, ferraduras para dar sorte na venda do vinho),
"reservados exclusivamente aos homens da classe popular e às
prostitutas, que surgem duas mulheres que ficaram na história do fado, a
Severa e a Cesária", explica Sofia Bicho, uma das responsáveis
pelo museu.
Em meados do século XIX, também a aristocracia desce
aos bairros populares para ouvir o fado que mais tarde transporta para
dentro de sua casa, como se pode ver na sala seguinte, onde uma dama
aristocrata toca fado numa pianola.
A exposição, que conta com 13
500 peças (a maioria resultante de doações), prossegue levando o
visitante a tentar fazer a distinção entre os três tipos de fado
tradicional, o menor, o mouraria e o corrido. Na parede, a explicação de
cada um, nos postos de escuta a distinção sonora. Mesmo ao lado, uma
vasta colecção de prémios. Em destaque, o busto de Amália e o prémio
que a BBC atribuiu no ano passado a Mariza.
Já no século XX, a
mostra dá-nos conta da importância do teatro na divulgação do fado,
nomeadamente através das cegadas (representações de carácter amador).
Geralmente eram grupos de homens que, se necessário, se vestiam de
mulher. E lá está Alfredo Marceneiro de xaile na cabeça. A revista foi
também impulsionadora do fado pela voz de fadistas/actores como Amália,
Hermínia Silva ou Anita Guerreiro.
É aqui que começa a
profissionalização do fado, fortemente reforçada pelo aparecimento da
rádio, da gravação de discos e do cinema. E lá estão gravações de
programas de rádio, nomeadamente da Emissora Nacional e do Rádio Clube
Português. E também uma enorme parede forrada com discos, dos velhos 78
rotações ao CD. Numa sala de cinema em miniatura pode assistir-se a
dois excertos de dois filmes A Última Pega, onde se pode observar uma
desgarrada entre Vicente da Câmara e Fernando Farinha, e Fado, História
de Uma Cantadeira, onde se vê Amália.
Mais além, um pequeno
apontamento sobre a importância da televisão na divulgação do fado. Um
cantinho destinado a homenagear a componente instrumental, de que a
guitarra é o ex-líbris. Um outro que enaltece o fado de Coimbra, tão
diferente do de Lisboa. Espaço ainda para revelar alguns dos nossos
poetas populares e popularizados pelo fado. Sequem-se os eruditos. Para
finalizar a exposição, nada melhor do que visitar uma réplica de uma
casa de fados, cujas paredes estão forradas com objectos ligados ao
fado, nomeadamente xailes coloridos, fotografias dos artistas,
partituras, e, é claro, as mesas em madeira onde nos podemos sentar,
ver, ouvir e... sentir o fado.
No meio de tanta informação é
impossível passar despercebida a Casa da Mariquinhas,
minuciosamente construída por Alfredo Marceneiro, que, para além de não
ter esquecido as tais janelas que tinham tabuinhas, afixou nas paredes
as diversas versões da letra original.
Posto isto, nada disto é triste... Tudo isto é fado!