Pedro Moutinho e os problemas de circulação sanguínea
O fado amador está na moda. Mas se antigamente quem recorria às velhas tascas para tentar o seu golpe de sorte ia com a lição bem sabida, hoje em dia há quem o faça apenas por brincadeira, sem pensar que para os músicos (e quem está a ouvir) aqueles minutos podem ser um verdadeiro suplício. Mas como lhes dizer de forma simpática que são péssimos a cantar? A história de hoje fala sobre isto, após uma dissertação com o fadista Pedro Moutinho , numa noite tardia de fados como tantas outras.
Bairro Alto. À porta da mítica antiga "Toca" do Carlos Ramos (na Rua Diário de Notícias), juntei-me à conversa com o Pedro Moutinho e o Mário Gameiro - que, para quem não sabe, é filho de Alcídia Rodrigues, que nos tempos idos era uma das poucas compositoras existentes no fado, celebrizada pela "Fado do Embuçado". Nessa noite de Inverno o tema era a quantidade de gente que entope os sítios onde se pode cantar fado amador. Todos concordamos num aspeto: É bom que se dê oportunidade. Que todos possam tentar. Agora o que falta é a frontalidade que se tinha antigamente, para dizer: "Desculpe lá, você pode ser um bom ouvinte de fado, mas para cantar não tem jeito nenhum!".
Uma questão de circulação sanguínea
Pedro Moutinho que, embora tenha só 34 anos, já canta há mais de 20, costuma andar por essas casas quando termina a sua atuação no "Café Luso ". Discreto mas bem-humorado (bem ao estilo marialva), o mais novo fadista da dinastia Moutinho (ao todo os irmãos Moutinho são três: Pedro, Hélder e Camané ) vai observando as novas vozes e revelou-me qual o seu truque para, de forma delicada, dizer que alguém não tem queda para o fado.
"Muito simples, Vital", explicou-me o Pedro. "Ele acaba de cantar, convencido que canta bem. Nós, com toda a calma e boa educação só temos de dizer: Você até tem presença, ar de fadista, vê-se que o fado corre-lhe nas veias... Mas atenção. Acho que na realidade você tem um problema de circulação sanguínea".
Caso para dizer: Para bom entendedor, meia palavra basta... Esperemos que o pessoal com os ditos "problemas de circulação" a perceba.Vital D'Assunção