Fábia Rebordão - A oitava cor
Discos - Maio 20, 2011

Felizes estamos nós, todos, carentes de talentos e alternativas às modas pré-fabricadas e ao flagelo dos silêncios que às vezes parece depositar-se em nossas vidas – felizes ficamos quando descobrimos uma voz como a de Fábia Rebordão, feita de estrondo e de ternura, capaz de embalar e acordar, carregada de vivências e limpa de mazelas, sonhadora e magoada, futuro e memória.
Como se o Fado todo já lhe tivesse passado pelas mãos, tocado o coração e moldado a alma, como se a sua natural ingenuidade pudesse valer como a experiência de uma veterana e, em simultâneo, como se a escola prática abrisse a porta a algo de imaculado.
Fica à vista a marca distintiva do Fado que, julgo saber, foi o seu primeiro objectivo e o seu primeiro motivo ao cantar. De forma tão legítima como saudável, andou, deu a volta ao Mundo, vagueou entre Jazz e Bossa Nova, aprendeu e enriqueceu – sobretudo porque a sua autenticidade fadista (mesmo quando o seu canto não irrompe dentro das fronteiras estéticas e convencionais do Fado) nunca foi avançada como possível moeda de troca.
Pelo contrário: Fábia teve o bom senso de crescer de forma sustentada, de amadurecer sem pressa, de ganhar verdade para os poemas que agora escolhe. Sabia, talvez, que haveria de regressar à casa da partida, agora já sem compartimentos escondidos nem habitantes misteriosos.
Ao primeiro disco em nome próprio, Fábia Rebordão trata o Fado por tu, mas com o respeito dos que têm a certeza de ser veículos do eterno. Tem a ajuda preciosa de um doutorado professor desta aventura da teimosia, Jorge Fernando, que não desiste de trazer a terreno público os melhores com que se cruza.
Ouçam-se a Guitarra Portuguesa (Ângelo Freire) e os convidados que apadrinham este alvoroço de rigor e transcendência – mas não se esqueça que foi aqui que vimos trompas, flautas e cavaquinhos chegar ao Fado como parceiros maiores.
Este álbum, que se concentra na voz, de seda e rugas, de Fábia Rebordão, mostra as cores essenciais – as sete do arco-íris e mais a oitava, a do respectivo pote, que abre mão do ouro para receber a “pedra preciosa” que é este disco.
Já agora: nem o Fado é fantasia, nem Fábia é uma fábula. Antes assim.João Gobern