Cristina Nóbrega - um duende em Sevilha
Concertos - Janeiro 03, 2013


São criaturas misteriosas, com a habilidade de inflamar sentimentos que todos percebem e que ninguém sabe explicar. Caprichosos e invisíveis ao olho humano, vagueiam pela cidade sem que ninguém saiba ao certo onde estejam . Assim, no final de ano estiveram no Concerto de Cristina Nóbrega em Sevilla, acompanhada pela inconfundível guitarra de outro duende mágico: Carlos Gonçalves e a viola de Julio García.
Marcado por uma tendência ao fado tradicional (Franklin, Pedro Rodrigues, Dois Tons, Menor, Mouraria, Bailarico, Idanha, Vitória, Zée Grande) interpretou temas do seu repertório habitual: Eu quería cantar-te um fado, Duas lágrimas de orvalho, Dise-te adeus e morrí, Malmequer pequenino, Zanguei-me con o meu amor, Madrugada de Alfama, aqui acompanhada pelo público, Havemos de ir a Viana e Lisboa Antiga.
No podía faltar nesta ocasião um dos fados mais bonitos do seu repertório “Questão de culpa”, poema de Vasco Graça Moura ao qual musicou Carlos Gonçalves. Mas talvez o mais interessante deste Concerto foi um pequeno adiantamento do que será o seu próximo CD. Um álbum que verá próximamente a luz, composto por treze fados da autoria do “fadista” com maiúsculas Tiago Torres da Silva e direcção musical de Pedro Jóia.
Assim interpretou “Fado das voltas” Dois Tons, “Um quê de eternidade” Zé Grande, “Quando o mar nos leva ao fado” Bailarico, e uma preciosa e arrepiante história no Fado Menor com Versiculo, “Um fado para Fred Astaire” que narra como só Tiago Torres podía fazê-lorlo, uma passagem naquele triste outono de 1984 em que Amália se encontrava em New York.
Depois de uma larga salva de palmas a ritmo de bulerías, entoou “Povo que lavas no rio”. Que “La Nóbrega” aborde fados tradicionais não é por si só uma novidade, mas sim quanto a tradicionais-inéditos, simplesmente por carecer de influências neste estilo, sem outras referencias que Amalia Rodrígues. O que dá lugar a um fado puro mas distinto, com um estilo pessoal (muito Nóbrega) sereno e intimista. De sua voz, perfeitamente modulada foram brotando os poemas, marcando as palavras precisas, as matizes e as pausas necessárias, sem apenas adornos, com a sensibilidade intrínseca da elegância. Depois do concerto, na receeição que teve lugar no Consulado de Portugal, os convidados, motivados pela fadista, assediaram Cristina Nóbrega com o despreocupado carinho andaluz, brindando seus copos com ela em repetidas ocasiões, em agradecido Portu-ñol. Javier Gonzalez