Celeste Rodrigues: “Quero viver pelo menos até aos 100 anos”
Entrevistas - Agosto 30, 2015
Na companhia do neto, Diogo, e dos bisnetos, Sebastião e Gaspar, Celeste Rodrigues foi a cicerone no Museu do Fado.
A conversa passou, inevitavelmente, por Amália, a irmã que só conheceu
aos cinco anos, mas com quem criou uma relação de grande cumplicidade.
Encontrámos Celeste Rodrigues, de 92 anos, o seu neto, o realizador Diogo Varela Silva, de 44 anos, e os filhos deste, Sebastião e Gaspar, num espaço que lhes é muito familiar, o Museu do Fado, para uma conversa em que Amália Rodrigues, irmã mais velha de Celeste, também ‘participou’, mirando-nos das fotografias que a imortalizam naquelas paredes. Vamos escutá-los!
– A sua família veio do Fundão para Lisboa em 1928. Que recordações tem da sua infância, Celeste?
Celeste Rodrigues – Do Fundão, poucas, pois vim para Lisboa com cinco anos. Lembro-me de que o meu pai era músico numa banda e que depois arranjou um contrato em Lisboa e mudámo-nos para cá. Só conheci a minha irmã Amália nessa altura, porque ela já cá vivia, mas depois não nos largámos mais. Onde ia uma, ia a outra. Chorava uma, chorava a outra, como se fossemos gémeas.
– E dos seus avós, que recordações tem?
– Do meu avô materno, tenho recordações maravilhosas. Quando chegava do trabalho, os netos agarravam-se todos a ele, era muito querido. A minha avó paterna era magrinha e senhora do seu nariz. Não vivia connosco, mas também tenho boas recordações dela. Os nossos serões eram passados a cantar e a ouvir música. A minha mãe tinha uma voz como nunca ouvi... Tudo o que eu e a minha irmã cantávamos, devemos-lho a ela! Agora convive-se pouco, vemos as famílias juntas na mesma mesa, mas em vez de conversarem, cada um está a mexer no seu telemóvel...
– Falando de família, nem o casamento nem os filhos estavam nos seus planos...
– Eu tinha medo de não estar à altura da responsabilidade. Mas depois de ter a primeira filha, quis logo ter a segunda. Penso que, ao ter um filho, qualquer pessoa se sente a mais rica do mundo. É uma alegria!
– E que tipo de avós foram os seus pais?
– A minha mãe era uma avó melhor do que eu. Quando alguém estava doente, ela ficava acordada toda a noite, a tentar baixar a febre...
– Como lidava com o facto de ir para fora cantar e ter de deixar cá as suas filhas?
– Custava-me imenso! Ainda assim, recusei várias ofertas para poder ficar com as filhas e com os netos. Repare, eu nem tinha sonhado ser artista, queria ser aviadora. É engraçado, até tenho medo de andar de avião!
– As suas filhas vivem nos EUA. Costuma visitá-las?
– Quando ia lá cantar, ficava sempre um mês ou mais... Agora, falamos muito pelo Skype. O meu neto Diogo fez lá o liceu, mas depois quis vir para Portugal, para minha casa. Acabou por se tornar o meu agente.
– Que tipo de avó foi?
– Ia buscar e pôr à escola... fazer a comida é que não, que sou má cozinheira. Se fazia um prato de que o Diogo gostasse, andava uma semana inteira a fazer-lhe a mesma coisa [risos].
– Mas, claramente, o coração dele sempre esteve inclinado para o mesmo lado que o da avó...
– Ele só tem pena de não cantar! Mas os meus bisnetos vão pelo mesmo caminho. O Sebastião tem uma banda e quer seguir a carreira de cineasta do pai. Quando canta em inglês, canta muito bem. Já o fado... é uma desgraça.
– O que sente quando ouve o seu bisneto Gaspar dizer que quer aprender a tocar guitarra portuguesa para a acompanhar?
– Como quero viver pelo menos até aos 100 anos, ele ainda tem muito tempo para o fazer e, de facto, já me acompanhou várias vezes! Tenho muito prazer na vida, em abrir os olhos, em ver e ouvir coisas maravilhosas. As pessoas são exigentes demais, acham que precisam de muita coisa para viver.
– Não sente saudades de nada?
– Sinto saudades da minha infância! Tinha a família toda junta... Como seres humanos, todos eram muito bonitos.
– Diogo, falando do seu avô Varela Silva, que é uma grande referência no teatro nacional, que recordações tem dele?
Diogo Varela Silva – Tenho recordações ótimas! Na minha estreia, deu-me uma foto dele com uma dedicatória que ainda hoje guardo: “Para aquele que há de ser o ator Diogo Varela, do seu já admirador Varela Silva.” Mais tarde cheguei a ser encenado por ele, mas eu era muito canastrão... O meu lugar é atrás das câmaras.
– O que sente ao ver o seu filho Gaspar a tocar guitarra portuguesa e a acompanhar a bisavó?
– Sinto um orgulho enorme quando vejo os meus filhos em palco, quer seja o Gaspar com a sua guitarra portuguesa, seja o Sebastião com a sua banda. É óbvio que é uma ternura ver o Gaspar tocar para a bisavó, são 80 anos de diferença, é uma recordação linda que ele sempre terá da avó Celeste.
– Gaspar, como aconteceu isto de querer tocar guitarra para a sua bisavó?
Gaspar – Sempre gostei de fado e de ouvir a minha avó, e quis aprender para poder acompanhá-la.
– E continua a dizer que ela é a maior fadista do mundo?
– Claro, a avó Celeste e a tia Amália!
– Se fossem convidados a participar num concurso de talentos, aceitariam o convite?
Sebastião – Tal como à nossa bisavó, o que nos interessa não é a exposição mediática, mas sim trabalhar muito e com qualidade!
Diogo – A minha avó até atende o telefone com uma voz diferente para não a convidarem para nada na televisão. Usa a pronúncia do Fundão e finge ser a empregada, diz sempre: “A senhora não está!”. [risos]
Encontrámos Celeste Rodrigues, de 92 anos, o seu neto, o realizador Diogo Varela Silva, de 44 anos, e os filhos deste, Sebastião e Gaspar, num espaço que lhes é muito familiar, o Museu do Fado, para uma conversa em que Amália Rodrigues, irmã mais velha de Celeste, também ‘participou’, mirando-nos das fotografias que a imortalizam naquelas paredes. Vamos escutá-los!
– A sua família veio do Fundão para Lisboa em 1928. Que recordações tem da sua infância, Celeste?
Celeste Rodrigues – Do Fundão, poucas, pois vim para Lisboa com cinco anos. Lembro-me de que o meu pai era músico numa banda e que depois arranjou um contrato em Lisboa e mudámo-nos para cá. Só conheci a minha irmã Amália nessa altura, porque ela já cá vivia, mas depois não nos largámos mais. Onde ia uma, ia a outra. Chorava uma, chorava a outra, como se fossemos gémeas.
– E dos seus avós, que recordações tem?
– Do meu avô materno, tenho recordações maravilhosas. Quando chegava do trabalho, os netos agarravam-se todos a ele, era muito querido. A minha avó paterna era magrinha e senhora do seu nariz. Não vivia connosco, mas também tenho boas recordações dela. Os nossos serões eram passados a cantar e a ouvir música. A minha mãe tinha uma voz como nunca ouvi... Tudo o que eu e a minha irmã cantávamos, devemos-lho a ela! Agora convive-se pouco, vemos as famílias juntas na mesma mesa, mas em vez de conversarem, cada um está a mexer no seu telemóvel...
– Falando de família, nem o casamento nem os filhos estavam nos seus planos...
– Eu tinha medo de não estar à altura da responsabilidade. Mas depois de ter a primeira filha, quis logo ter a segunda. Penso que, ao ter um filho, qualquer pessoa se sente a mais rica do mundo. É uma alegria!
– E que tipo de avós foram os seus pais?
– A minha mãe era uma avó melhor do que eu. Quando alguém estava doente, ela ficava acordada toda a noite, a tentar baixar a febre...
– Como lidava com o facto de ir para fora cantar e ter de deixar cá as suas filhas?
– Custava-me imenso! Ainda assim, recusei várias ofertas para poder ficar com as filhas e com os netos. Repare, eu nem tinha sonhado ser artista, queria ser aviadora. É engraçado, até tenho medo de andar de avião!
– As suas filhas vivem nos EUA. Costuma visitá-las?
– Quando ia lá cantar, ficava sempre um mês ou mais... Agora, falamos muito pelo Skype. O meu neto Diogo fez lá o liceu, mas depois quis vir para Portugal, para minha casa. Acabou por se tornar o meu agente.
– Que tipo de avó foi?
– Ia buscar e pôr à escola... fazer a comida é que não, que sou má cozinheira. Se fazia um prato de que o Diogo gostasse, andava uma semana inteira a fazer-lhe a mesma coisa [risos].
– Mas, claramente, o coração dele sempre esteve inclinado para o mesmo lado que o da avó...
– Ele só tem pena de não cantar! Mas os meus bisnetos vão pelo mesmo caminho. O Sebastião tem uma banda e quer seguir a carreira de cineasta do pai. Quando canta em inglês, canta muito bem. Já o fado... é uma desgraça.
– O que sente quando ouve o seu bisneto Gaspar dizer que quer aprender a tocar guitarra portuguesa para a acompanhar?
– Como quero viver pelo menos até aos 100 anos, ele ainda tem muito tempo para o fazer e, de facto, já me acompanhou várias vezes! Tenho muito prazer na vida, em abrir os olhos, em ver e ouvir coisas maravilhosas. As pessoas são exigentes demais, acham que precisam de muita coisa para viver.
– Não sente saudades de nada?
– Sinto saudades da minha infância! Tinha a família toda junta... Como seres humanos, todos eram muito bonitos.
– Diogo, falando do seu avô Varela Silva, que é uma grande referência no teatro nacional, que recordações tem dele?
Diogo Varela Silva – Tenho recordações ótimas! Na minha estreia, deu-me uma foto dele com uma dedicatória que ainda hoje guardo: “Para aquele que há de ser o ator Diogo Varela, do seu já admirador Varela Silva.” Mais tarde cheguei a ser encenado por ele, mas eu era muito canastrão... O meu lugar é atrás das câmaras.
– O que sente ao ver o seu filho Gaspar a tocar guitarra portuguesa e a acompanhar a bisavó?
– Sinto um orgulho enorme quando vejo os meus filhos em palco, quer seja o Gaspar com a sua guitarra portuguesa, seja o Sebastião com a sua banda. É óbvio que é uma ternura ver o Gaspar tocar para a bisavó, são 80 anos de diferença, é uma recordação linda que ele sempre terá da avó Celeste.
– Gaspar, como aconteceu isto de querer tocar guitarra para a sua bisavó?
Gaspar – Sempre gostei de fado e de ouvir a minha avó, e quis aprender para poder acompanhá-la.
– E continua a dizer que ela é a maior fadista do mundo?
– Claro, a avó Celeste e a tia Amália!
– Se fossem convidados a participar num concurso de talentos, aceitariam o convite?
Sebastião – Tal como à nossa bisavó, o que nos interessa não é a exposição mediática, mas sim trabalhar muito e com qualidade!
Diogo – A minha avó até atende o telefone com uma voz diferente para não a convidarem para nada na televisão. Usa a pronúncia do Fundão e finge ser a empregada, diz sempre: “A senhora não está!”. [risos]
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