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O fado no Brasil - Maria Girão

Maria Girão nasceu em Salvador, capital baiana, em 29 de março de 1928. Aos 18 anos uniu-se ao guitarrista português Fernando de Freitas.

Do seu casamento com Freitas, Maria Girão teve quatro filhos, somente um sobreviveu até à idade adulta, o músico Fernando Girão (1951).

Filha de portugueses, Maria Girão logo se tornou uma fadista conhecida e respeitada. Trabalhou no eixo Rio de Janeiro – São Paulo, entre as décadas de 1940 a 60, sendo uma das grandes atrações dos nossos restaurantes do passado.

Na capital paulista, a “fadista brasileira” actuou nas casas típicas Adega do Douro, Adega da Mouraria, Adega Lisboa Antiga, Abril em Portugal e na sua própria casa, O Fado.

A Adega da Mouraria situava-se na Rua Albuquerque Lins, nº 348, no centro. Pertencia ao casal João e Inês Fernandes, radialistas – pioneiros na divulgação da música portuguesa na rádio paulista, e proprietários da loja de discos Rádio Hitz, à Praça Marechal Deodoro.

A intérprete gravou quatro LP's pela etiqueta Continental. Nos anos 50, esteve durante dez meses em tourné artística, percorrendo Portugal e as antigas “Áfricas portuguesas”.

As atuações de Maria Girão na Adega Lisboa Antiga eram bastante concorridas. A fadista Teresinha Alves nos conta que aprendeu a cantar o fado castiço com a intérprete baiana, na “Lisboa Antiga”.

A jornalista Helena Silveira refere-se à atuação de Maria Girão na crónica "Paisagem e memória: o Fado, essa saudade", publicada na Folha de S. Paulo em 24/6/1960.

“Ouço na ‘Lisboa Antiga’ uma fadista de fatalidade lusitana na voz. Às vezes, como é o caso do velho fado Perseguição, a exemplo das cantoras do género, ela tem um gesto dramático de envolver-se mais no seu eu como uma pobre mulher das ruas de Lisboa. Os braços se cruzam sobre o pano em arremedo de crucificação enquanto a voz lhe sobe como um punhal que ferisse no ar. Ao meu lado o dono do estabelecimento, o Sr. Luiz de Campos, diz. ‘Esta é Maria Girão, fadista baiana que esteve em Portugal e nas colónias da África, alcançando extraordinário êxito’.

Isto pode acontecer no Brasil. Inclusive uma baiana cantar fados. E cantar daquele modo, como uma Amália Rodrigues, como uma espécie de canário dentro do peito. Em compensação o português Abílio Herlander (que belíssima voz!) canta o João Valentão de Caymmi como se jamais houvesse deixado a praia de Itapoã, conhecesse Iemanjá que se lhe apareceu num retorno de jangada. Canta Copacabana de João de Barro com disponibilidade de rapaz do ‘Sascha’s’[1] e, diante dos dois casos ficamos pensando que a retórica luso-brasileira, não é palavreado vão. Se pesquisarmos bem, em nossa modinha, encontramos as antíteses do Sr. Luiz Vaz de Camões.

A raiz moura do fado descobre-se a toda hora. Houve um momento, quando se ouvia canções de além Tejo que me lembrei de ‘dabké’ da montanha libanesa. O mesmo ritmo e aquela alegria de pés batendo no chão como se as criaturas fossem arbóreas que quisessem que a terra reconsiderasse a ruptura do milênio.

É o possível que o fado haja mesmo nascido no Brasil, de pura saudade maruja, e talvez essa sua condição que lhe empreste feito na onda rolando, que vai e vem e bate em praia daqui e de lá mesma, beleza de música acordar nostalgias fundas que ninguém sabia que morava dentro do peito…”.

Em 1966, Maria Girão passou a viver com o cantor luso Tony Silva. Juntos montaram o restaurante típico português O Fado, à Rua 13 de Maio, na Bela Vista. A nova casa mereceu uma ótima reportagem de duas páginas da Revista do Rádio. Rapidamente ganharam freguesia cativa.

Tony Silva nasceu em 1936, em Lisboa. Começou a cantar ainda menino. Já profissional viajou por toda África, em seguida, resolveu vir para o Brasil. Aportou na Praça Mauá, no Rio de Janeiro, e imediatamente entrou em contato com seus amigos artistas, que lhe conseguiram um contrato. Como era um intérprete romântico e cantava de tudo, não demorou para adaptar-se a nossa bossa nova. Pela sua voz e pela beleza física, tornou-se um galã. Gravou alguns discos para a Continental.

O Fado não durou muito: dois anos depois da sua inauguração, em 1968, Maria Girão e Tony transferiram-se para Portugal, onde seguiram suas carreiras artísticas.

Maria Girão faleceu aos 79 anos, em 9 de abril de 2007, na Casa do Artista, em Lisboa.


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