Estrelas iluminaram a noite no TNSJ
A partir das 21h30 de sexta-feira, 13 de Julho em curso, tomei lugar na plateia do Teatro São João com o exclusivo intuito de ouvir pela primeira vez ao vivo Ricardo Ribeiro, um jovem intérprete de fado lisboeta que me tinha sido apresentado dois dias atrás pelo veterano fadista portuense Fernando Teodoro com a recomendação de muito-bom. Através de um vídeo que logo a seguir apreciei na Internet, tinha já constatado que o Ricardo era de facto dotado de um excelente domínio interpretativo, assaz rigoroso no debruço fadista e a pender para o estilo marialva muitíssimo bem burilado.
Avesso que sou às lides que negligentemente estragam o Fado, a passar por tempos de abrupto estrago, esperava assistir a mais um daqueles oportunistas eventos de cultura-snob que, acobertados «em-nome-de», ao efecuarem a troca-baldroca, só produzem burla mixordante. Olhando à data, cogitei que em «sexta-feira-13» o azar teria escolhido uma forma suave de meter-se comigo, mas não, já que a probabilidade do azar voltou-se num ápice em agradável e «surpreendente-surpresa».
Assim que o palco ficou exposto, sob cenário liso em absoluto simples engenhosamente iluminado, surgiram cinco vultos ao centro, três sentados e dois de pé. Em primeiro plano, o percursionista (Jarrod Cagwin), o solista em alaúde árabe (Rabih Abou-Khalil), que adiante seria muitas mais coisas, e o vocalista (Ricardo Ribeiro). Logo atrás, a dar-me ideia posicional da constelação de Orion, o baixista polivalente (Michel Godard) e o acordeonista (Luciano Biondini). O trecho de abertura, em som vivo excelentemente colocado, tirou-me de imediato de qualquer espécie de cepticismo e internei-me expontâneo no exercício, por completo ausente de ideias e cálculos confrontantes. Dois minutos após já avaliava o Ricardo muito para além do condicionalismo fadista e no entanto sentia-me agradavelmente envolvido em Fado.
A primeira salva de palmas foi forte e convicta, soando inequívoca a aplauso sincero. Num português artisticamente arranhado - friso artisticamente - o hábil Rabih Abou Kalil, abraçado como um menino ao amarelinho alaúde, fez a apresentação de cada um dos elementos, satirizando, numa bem urdida e sábia rábula, as diferentes origens dos seus companheiros, ali sem dúvida alguma reunidos pelo magistral poder universal da música.
Depois, o que vi, ouvi e senti durante cerca de hora-e-meia de magnífico espectáculo, dividido em duas partes, leva-me a afirmar que presenciei quatro exímios músicos, algo fora do comum em tão comum situação, e duas excelências vocais portuguesas, se bem que Tânia Oleiro, na linha de Teresa Salgueiro, careça de macerar a expressão para se libertar do tom demasiado juvenil que de sua voz emana.
Entretanto, os cerca de duzentos espectadores que assistiram ao espectáculo em apreço, fascinados pelos aprazíveis momentos perpassados, valeram por um milhar no empolgante aplauso final que merecidamente atribuíram aos seis artistas a sério que acabavam de fruir, algo que Portugal inteiro deveria ver, ouvir e sentir, pois trata-se de um brilhantíssimo ensaio musical que à volta do Fado flui harmonioso pelos mais diversos géneros de música.
Cumprimentos, Ricardo Citação