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Helder Moutinho ao vivo no São Luiz, uma bela celebração de fado

Concertos - Março 28, 2018
Na mesma noite em que Bob Dylan esgotava a Altice Arena com as suas releituras de clássicos, o São Luiz enchia-se (não totalmente, mas quase) para ouvir fados: Helder Moutinho, “puro e duro”, com Escrito no Destino.

Não foi, como ele já avisara, um espectáculo conceptual, à semelhança de outros anteriores ou até dos seus mais recentes discos, em particular 1987 ou O Manual do Coração. Foi, antes, uma espécie de regresso à casa de fados sem casa de fados, num palco mais largo mas nem por isso menos despido de artifícios. Importaram sobretudo a voz e a música; e Helder, perante uma plateia onde se vislumbravam vários músicos e fadistas (António Chaínho, Maria da Fé, os seus irmãos Camané e Pedro Moutinho, Gisela João ou Katia Guerreiro, entre outros), portou-se com garbo, apesar de algum (escasso) nervosismo que não chegou a atrapalhar, nem mesmo quando o micro falhou por alguns segundos, já na segunda parte, durante o fado Parceiros das farras (também conhecido por Partir é morrer um pouco).



O arranque fez-se com Fado Bailado, seguido de Volta a dar, Vielas de Alfama e Manual do Coração, um fado de cada um dos seus últimos quatro discos mas sem preocupações cronológicas, aliás como no resto do espectáculo. E já nestes primeiros ia Helder dando conta da maturidade que lhe habita a voz, com uma segurança e contenção nos tempos e no estilar bem dignas de admiração e aplauso. E se no Fado Bailado os seus lances altos alternados com baixos próximos do sussurro quase lembraram a expressão a que nos habituou, por exemplo, um Ricardo Ribeiro, já nos restantes Helder se mostrou em linha com a sua real identidade, alternando agora apenas fados dos dois discos mais recentes: Garota da Mouraria, Venho de um tempo, Já não te espero, Condão (esse fado-tango de Carlos Barretto), Quando o amor e Fado triste.

Depois, o palco ficou por conta dos músicos, Ricardo Parreira (guitarra portuguesa), André Ramos (viola de fado) e Ciro Bertini (baixo), numa daquelas guitarradas que evoluem em crescendo, alimentado primeiro pela guitarra e seguido agilmente pelas violas até a um clímax que é sempre aplaudido com euforia pelo público. Seguiram-se Amor sem lugar e O meu coração tem dias, a provar que as experiências musicais de O Manuel do Coração (aqui com Mário Laginha e Zeca Medeiros, respectivamente como autores das músicas) deram excelentes frutos. Depois, tal como sucedera no CCB, em Outubro de 2016, Helder recuperou Atrás dos meus cortinados, um tema de João Monge e João Gil que cantou nos tempos em que integrava o Quinteto Lisboa. Vieram depois Parceiros das farras, Minha cor (o único tema da noite vindo do seu disco de estreia, Sete Fados e Alguns Cantos, de 1999), Escrito no destino (do disco 1987, e que aqui deu título ao espectáculo), A saudade, Não faças caso e uma sequência de “sobras” bem sentidas e interpretadas: O que sobrou foi amor e O que sobrou da Mouraria.

Muitos aplausos e o inevitável regresso ao palco, de Helder e dos músicos. Primeiro para cantar O fado da Bia (que Fernando Tordo escreveu para Beatriz da Conceição e Helder gravou a fechar o disco 1987) e depois para dar voz a dois clássicos do fado: Resposta fácil (no Fado das Horas, gravado recentemente por Tânia Oleiro) e Fado de outrora (do repertório de Maria Teresa de Noronha). No final, 23 fados ouvidos e aplaudidos, era visível o contentamento dos músicos e do público. Helder Moutinho proporcionou-nos uma bela celebração do fado, numa sala que viria a encher-se no dia seguinte para ouvir (e aplaudir) jazz, com Joe Lovano e a Orquestra do Hot Clube. E assim ficou escrito no destino que Lisboa pode, quando quer, ter muito boa música.

Escrito no Destino será apresentado também no Porto, na Casa da Música, no dia 9 de Maio (às 21h30), e posteriormente no Entroncamento, Évora, Sintra e Vila do Conde.


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