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História do Fado

Nascido nos contextos populares da Lisboa oitocentista, o Fado encontrava-se presente nos momentos de convívio e lazer.Manifestando-se de forma espontânea, a sua execução decorria dentro ou fora de portas, nas hortas, nas esperas de touros, nos retiros, nas ruas e vielas, nas tabernas, cafés de camareiras e casas de meia-porta. Evocando temas de emergência urbana, cantando a narrativa do quotidiano, o fado encontra-se, numa primeira fase, vincadamente associado a contextos sociais pautados pela marginalidade e transgressão, em ambientes frequentados por prostitutas, faias, marujos, boleeiros e marialvas. Muitas vezes surpreendidos na prisão, os seus actores, os cantadores, são descritos na figura do faia, tipo fadista, rufião de voz áspera e roufenha, ostentando tatuagens, hábil no manejo da navalha de ponta e mola, recorrendo à gíria e ao calão. Esta associação do fado às esferas mais marginais da sociedade ditar-lhe-ia uma vincada rejeição pela parte da intelectualidade portuguesa.

Atestando a comunhão de espaços lúdicos entre a aristocracia boémia e as franjas mais desfavorecidas da população lisboeta, a história do fado cristalizou em mito o episódio do envolvimento amoroso do Conde de Vimioso com Maria Severa Onofriana (1820-1846), meretriz consagrada pelos seus dotes de cantadeira e que se transformará num dos grandes mitos da História do Fado, referencial agregador da comunidade fadista. Em sucessivas retomas imagéticas e sonoras, a evocação do envolvimento de um aristocrata boémio com a meretriz, cantadeira de fados, perpassará em muitos poemas cantados, e mesmo no cinema, no teatro, ou nas artes visuais, desde logo a partir do romance A Severa, de Júlio Dantas, publicado em 1901 e transportado para a grande tela em 1931, naquele que seria o primeiro filme sonoro português, dirigido por Leitão de Barros.

Também em eventos festivos ligados ao calendário popular da cidade, em festas de beneficência ou nas cegadas - representações teatrais de carácter amador e popular, na generalidade representadas por homens, nas ruas, verbenas, associações de recreio e colectividades - o fado ganharia terreno. Apesar deste tipo de representação constituir um divertimentos célebres do Carnaval lisboeta, de franca adesão popular e muitas vezes com um vincado carácter de intervenção, a regulamentação da censura em 1927 iria contribuir, de forma lenta mas irreversível, para a extinção deste tipo de espectáculo.

O Teatro de Revista, género de teatro ligeiro tipicamente lisboeta nascido em 1851, cedo descobrirá as potencialidades do fado que, a partir de 1870 integra os seus quadros musicais, para ali se projectar junto de um público mais alargado. O contexto social e cultural de Lisboa com seus bairros típicos, sua boémia, assume protagonismo absoluto no teatro de revista. Ascendendo aos palcos do teatro o fado animará a revista, estruturando-se novas temáticas e melodias. No teatro de revista, com refrão e orquestrado, o fado será cantado quer por famosas actrizes, quer por fadistas de renome, cantando o seu repertório. Ficariam na história duas formas diferentes de abordar o fado: o fado dançado e estilizado por Francis e o fado falado de João Villaret. Figura central da história do Fado, Hermínia Silva consagrou-se nos palcos do teatro nas décadas de 30 e 40 do Século XX, somando os seus inconfundíveis dotes de cantadeira com os de actriz cómica e revisteira.

Alargando-se o campo de apropriação do fado a partir do último quartel do séc. XIX, corresponde a esta época a estabilização formal da forma poética da “décima”, quadra glosada em quatro estrofes de dez versos cada, aquela em torno da qual se estruturaria o Fado para mais tarde se desenvolver em torno de outras variantes. Será também neste período que a guitarra, ao longo do século XIX, progressivamente difundida dos centros urbanos para as zonas rurais do país, se definirá na sua componente específica de acompanhamento do fado.

A partir das primeiras décadas do século XX o fado conhece uma gradual divulgação e consagração popular, através da publicação de periódicos que se consagram ao tema, e da consolidação de novos espaços performativos numa vasta rede de recintos que, numa perspectiva comercial, passava agora a incorporar o Fado na sua programação, fixando elencos privativos que muitas vezes se constituíam em embaixadas ou grupos artísticos para efeitos de digressão. Paralelamente, sedimentava-se a relação do Fado com os palcos teatrais, multiplicando-se as actuações de intérpretes de fado nos quadros musicais da Revista ou das operetas.

Com efeito, o aparecimento das companhias de fadistas profissionais a partir da década de 30, veio permitir a promoção de espectáculos, com elencos de grande nomeada e a sua circulação pelos teatros de norte a sul do País, ou mesmo em digressões internacionais. Tal foi o caso do “Grupo Artístico de Fados” com Berta Cardoso (1911-1997), Madalena de Melo (1903-1970), Armando Augusto Freire, (1891-1946) Martinho d’Assunção (1914-1992) e João da Mata e do “Grupo Artístico Propaganda do Fado” com Deonilde Gouveia (1900-1946), Júlio Proença (1901-1970) e Joaquim Campos (1899-1978) ou da “Troupe Guitarra de Portugal”, integrada, entre outros, por Ercília Costa (1902-1985) e Alfredo Marceneiro (1891-1982).



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Comentários
#1 jonas 2019-03-30 22:11 Falar de fado nos anos 90 sem falar no Paulo Bragança ou revela ignorância ou então uma maldadezinha que não se entende muito bem… ou se calhar até se entende! Citação
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