Carlos do Carmo - E ainda...
Records - Abril 13, 2021
É um ponto final num percurso ímpar na música portuguesa. Mas, como acontece sempre com a arte mais genuína, o último disco de Carlos do Carmo, "E Ainda...", aponta, também, para o infinito
Um disco póstumo parece ser sempre uma porta aberta para uma grande comoção, mesmo tristeza. Ainda mais neste contexto: Carlos do Carmo morreu no dealbar deste ano e sabíamos como um álbum novo vinha sendo anunciado, e adiado, nos últimos tempos. Chegou ao público a 16 de abril e o seu autor, desta vez, não está cá para assistir a esse momento. Mas pomos este E Ainda… a tocar e são muitos (outros) os sentimentos que nos invadem.
Há frescura, e bom humor, na voz logo no primeiro tema cantado (que se segue a um instrumental, Fado Zé – Introdução): Mariquinhas.com, com letra de Vasco Graça Moura, transportando o bordel da Mariquinhas para a era da internet. De repente, estamos com Carlos do Carmo. Há garra. E aquele timbre único que é património português de primeira água.
O derradeiro disco do fadista é breve (não chega aos 25 minutos de duração), até porque ficaram fados por gravar num processo que se prolongou por mais de dois anos, com avanços e recuos. Na sua base, como em tantas vezes numa carreira longa, estão poemas e palavras que Carlos do Carmo quis cantar. E encontramos assinaturas surpreendentes. A mais de todas é, talvez, a de Herberto Helder – autor de poemas que muito dificilmente imaginamos transformados em canções –, aqui cantado em Poemas Canhotos (com música do maestro António Vitorino d’Almeida). Há, também, Jorge Palma (Canção de Vida) e Hélia Correia (Sombra) que, pela primeira vez, escreveram para a voz de Carlos do Carmo, Júlio Pomar (num Bem Disposto, Então Vá tão divertido como sarcástico – “viver sempre também cansa, descanso é que não há”), José Saramago (Jogo do Lenço, poema que já tinha sido cantado pelo espanhol Luis Pastor) e Sophia de Mello Breyner (Canção 2).
As últimas palavras que Carlos do Carmo deixou gravadas num disco são de Mia Couto e ouvimo-las serenamente ditas, não cantadas, na derradeira faixa (Fado Zé – Fecho). Explicam, afinal, porque este disco póstumo traz tanta vida dentro, muito para lá da tristeza: “Cantar, dizem, é um afastamento da morte. A voz suspende o passo da morte e, em volta, tudo se torna pegada da vida.” Sabemos bem como há pegadas que demoram uma eternidade até se extinguirem.
Há frescura, e bom humor, na voz logo no primeiro tema cantado (que se segue a um instrumental, Fado Zé – Introdução): Mariquinhas.com, com letra de Vasco Graça Moura, transportando o bordel da Mariquinhas para a era da internet. De repente, estamos com Carlos do Carmo. Há garra. E aquele timbre único que é património português de primeira água.
O derradeiro disco do fadista é breve (não chega aos 25 minutos de duração), até porque ficaram fados por gravar num processo que se prolongou por mais de dois anos, com avanços e recuos. Na sua base, como em tantas vezes numa carreira longa, estão poemas e palavras que Carlos do Carmo quis cantar. E encontramos assinaturas surpreendentes. A mais de todas é, talvez, a de Herberto Helder – autor de poemas que muito dificilmente imaginamos transformados em canções –, aqui cantado em Poemas Canhotos (com música do maestro António Vitorino d’Almeida). Há, também, Jorge Palma (Canção de Vida) e Hélia Correia (Sombra) que, pela primeira vez, escreveram para a voz de Carlos do Carmo, Júlio Pomar (num Bem Disposto, Então Vá tão divertido como sarcástico – “viver sempre também cansa, descanso é que não há”), José Saramago (Jogo do Lenço, poema que já tinha sido cantado pelo espanhol Luis Pastor) e Sophia de Mello Breyner (Canção 2).
As últimas palavras que Carlos do Carmo deixou gravadas num disco são de Mia Couto e ouvimo-las serenamente ditas, não cantadas, na derradeira faixa (Fado Zé – Fecho). Explicam, afinal, porque este disco póstumo traz tanta vida dentro, muito para lá da tristeza: “Cantar, dizem, é um afastamento da morte. A voz suspende o passo da morte e, em volta, tudo se torna pegada da vida.” Sabemos bem como há pegadas que demoram uma eternidade até se extinguirem.
Pedro Dias de Almeida
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