Gisela João: “Tenho-me cruzado com tanta gente boa e com muito abutre também”
News - Julho 02, 2023
Nela aborda, desassombradamente, o seu trajeto de luta e superação: “A minha avó sempre me disse: ‘vai, filha, vai sempre direitinha’, e até hoje esse direitinha me bate à porta todos os dias”
Num longo texto publicado nas suas rees sociais, a fadista de Barcelos lembrou o papel da sua família na construção da sua carreira: “A minha tia-avó Arminda - quando no Verão vinha de carro cheio, desde França, e de coisas inimagináveis para mim, pequenina, que mal dormia para ir a correr a casa dela, agarrar-me ao avental dela, ver as comidas que ela fazia, diferentes, e os batons das primas e os cabelos que me faziam sonhar - sempre me disse: 'filha, tu vai para o mundo, não tenhas medo, tu vai'”.
"A minha avó também sempre me disse: 'vai, filha, vai sempre direitinha', e até hoje esse direitinha me bate à porta todos os dias. Eu fui, nem sabia bem para onde, mas ia indo. Sinto, hoje, que não tinha muita hipótese: é a cantar que me explico. Sinto que não me dou a conhecer a ninguém, só quando canto, a quem me quiser entender".
“Este pedaço de coisa [o disco de estreia], fez-me possível conhecer o mundo, fez-me possível pegar no que queria no supermercado, fez-me possível ajudar, fez-me possível ir ao Algarve (desde a escola primária, quando escrevíamos a composição do verão e os colegas tinham todos ido ao Algarve, que sonhava em lá ir), fez-me sentir ouvida, fez-me possível ter a minha casa de paredes todas brancas, e com muito silêncio como sonhava, fez-me ir ao Brasil com que sonhava desde a Tieta”, prosseguiu.
Realçando que "nunca quis ser famosa", Gisela João salientou que "houve músicos que não fizeram parte do projeto porque o que eu queria fazer 'não era bem fado'", acrescentando: "este pedaço de coisa fez-me possível mostrar quem sou da forma mais honesta possível, cantando".
“As coisas aconteceram-me sempre tarde e continuam assim - penso muito e isso come-me tempo - continua a ser no canto que encontro os lugares mais bonitos que eu conheço e continuo a acreditar na música pela música. Pelos arrepios, pelos sorrisos, pelas lágrimas, pelos olhos a brilhar”, sublinha. "Tenho-me cruzado com tanta gente boa e talentosa, e com muito abutre também. Quando decidi gravar este disco, juro que nunca pensei que a minha vida ia mudar, pensei que ia continuar na minha vidinha, mas a coisa ia crescendo e eu só dizia sim e acompanhava".
"É possível chegar aos sonhos onde, normalmente, apenas os que saem mais da frente na linha de partida conseguem viver, da música. Tornei-me ainda mais solidão nesta cidade grande e no mundo, tendo sempre só a canção mas está tudo bem", rematou.