Sara Correia: "Não me levo a sério, levo o meu fado muito a sério"
Entrevistas - Fevereiro 12, 2024
A fadista Sara Correia vai subir ao palco dos Coliseus de Lisboa e Porto em março e deu uma entrevista na qual falou sobre o seu percurso e sobre a forma como encara a música hoje em dia, sem esquecer as suas raízes.
Aara Correia começou a dar os primeiros passos no fado ainda em criança e nunca mais parou. Com 30 anos, a artista tem já três álbuns lançados e prepara-se para subir aos Coliseus de Lisboa - nos dias 9, 10 e 11 de março - e do Porto - no dia 22 do mesmo mês, sendo que as duas primeiras datas para a capital e a data da Invicta já se encontram esgotadas.
A fadista esteve à conversa numa entrevista na qual falou sobre a infância, revelou qual a colaboração mais especial que fez, com quem gostaria de gravar um tema brevemente, quem considera que seja o seu 'pai' no mundo da música, partilhando ainda como foi a experiência de ter sido mentora no programa de talentos da RTP, 'The Voice'.
Nasceu numa família em que o fado esteve sempre presente. Nunca pensou ser outra coisa?
Não. Eu canto desde pequenina, até em casa... então acho que era o meu destino. Sempre tive a oportunidade de cantar em várias casas de fado, sempre me dei com pessoas que cantavam e sempre fui muito ligada à música, por isso acho que se não fosse cantora teria uma profissão ligada à música, nunca iria fugir desta arte.
Tem alguma memória de infância ligada à música?
Quando a minha mãe cantava para mim. Mas não eram fados, eram coisas mais populares. Eu chorava muito a ouvi-la cantar e às vezes cantava com ela.
Já a cantar ao vivo, acho que a experiência que me marcou mais foi quando participei n' A Grande Noite do Fado', que me permitiu cantar num Coliseu. Foi espetacular.
A Sara já tem uma carreira consolidada. Começou a cantar muito nova, já tem álbuns lançados...
Não considero que seja uma grande carreira. Sinto que a comecei a partir do momento em que comecei a gravar os meus discos, já com alguma maturidade. Sinto que o meu caminho no fado até então - portanto até aos meus 22 anos - foi só um caminho que eu fui traçando. Considero que os álbuns é que vão marcando carreiras, portanto acho que ainda estou no início, ainda tenho muito que cantar e muito que dizer.
Considera que existiu um ponto de viragem na sua carreira? Quando?
Foi quando eu gravei o meu primeiro álbum, 'Sara Correia' [lançado em 2018]. Na verdade não é o meu primeiro álbum, porque eu gravei um trabalho com 14 anos, quando venci 'A Grande Noite do Fado, mas não considero que aquele disco tenha coisas minhas, eram só músicas que eu aprendi, não foi uma coisa estruturada, não tem muito a ver comigo. Gravei aquele álbum, porque na altura era esse o prémio para o vencedor. Se soubesse o que sei hoje não o teria feito.
Não teria gravado esse álbum? Porquê?
Era muito nova. Acho que no fado, principalmente, precisamos de viver, de ter histórias, e com 13 anos eu não sabia grande coisa da vida. Não tinha passado pelas histórias de amores e desamores, de ser livre, essas coisas que fazem com que o fado seja muito mais sentido. É nesse sentido que eu digo que não o teria feito. Não me arrependo, mas naquela altura ainda não tinha nada para dizer.
Todos os álbuns que gravou são diferentes e contam momentos distintos da sua vida. Em que é que este último, 'Liberdade' [lançado em 2023], difere dos outros?
Com os outros dois álbuns eu viajei imenso, cantei imenso lá fora, aprendi muita coisa, ouvi muita música, conheci muitos artistas e, na verdade, conheci-me cada vez mais. Agora, não sei se é por ter feito 30 anos, mas hoje sei o que é que quero para a minha vida, sem ter qualquer amarra ou querer agradar às outras pessoas. Quero agradar-me a mim e sentir-me bem comigo própria e acho que é por isso que este disco se chama 'Liberdade', exatamente porque me sinto livre, sinto que sou uma pessoa sem medo de nada. Não me levo muito a sério, levo o meu fado muito a sério e acho que isso é que faz com que consiga cantá-lo sem ser amargurada.
De todas as colaborações que fez, qual foi a que mais a marcou e porquê?
Acho que a música que cantei com o Pedro Abrunhosa, 'Que O Amor Te Salve Nesta Noite Escura' foi a mais especial pelo que representa, é uma música de apoio à Ucrânia. É marcante pelo facto de nos juntarmos por uma causa e acho que isso vai além da música. Eu conheci o Pedro - e ele vai rir-se disto - mas sinto que ele é quase um pai para mim na música. É uma pessoa que me ajuda muito, que me ensinou muito dentro do estúdio e eu adoro o trabalho dele. Acho que foi um projeto muito especial e acredito que as pessoas sentiram isso também, que é o mais importante.
Com quem gostaria de gravar um tema nos próximos tempos?
Com o Sam The Kid.
É um estilo de música totalmente diferente.
Sim, é verdade, mas eu cresci com o hip hop do meu lado também. Além disso, o Sam é meu vizinho, eu cresci a ouvi-lo. Também gosto muito de Slow J. Gostava muito de fazer coisas que não tivessem de ser só dentro do fado, algo que me permitisse levar o fado para dentro de outra música. Acho que é incrível e acaba sempre por resultar em sons completamente diferentes daquilo a que as pessoas estão habituadas.
No ano passado, a Sara foi mentora nos programas da RTP 'The Voice Gerações' e 'The Voice'. O que é que essas experiências lhe trouxeram de positivo?
Não é segredo para ninguém que eu não estou completamente tranquila em falar sobre mim e o 'The Voice' mudou a minha exposição pública. Isso para mim foi um desafio, porque eu tinha de mostrar às pessoas quem eu era, sem qualquer receio. Essa foi a primeira 'viragem' que o 'The Voice' me trouxe. Depois, foi o facto de a minha música ter chegado a muito mais gente. Foi muito gratificante nesse sentido, o 'The Voice' foi muito importante para mim e espero voltar.
Então tem planos de regressar ao programa?
Planos não sei, vontade sim. Não sei se consigo conciliar tudo, porque este é o ano em que tenho mais concertos agendados. Mas se me convidarem outra vez, vou aceitar.
Como é que se encara a responsabilidade de ser mentora de pessoas que estão a dar os primeiros passos na música?
A partir do momento em que ficamos com um concorrente é uma grande responsabilidade que cai em cima de nós, de conseguir levar aquela pessoa o mais longe possível, não só no programa, mas longe como artista, como cantor. Dar-lhes os melhores conselhos, tentar que eles se encontrem também. E depois tem muito que ver com a idade de cada um. Mas é um trabalho construtivo, cresci muito com eles. Acredito que [ser mentor] faz com que sejamos muito mais humanos.
'Chelas' é uma das suas músicas mais conhecidas, é especial por falar das suas raízes e foi escrita pela Carolina Deslandes. Como é que surgiu essa parceria?
Foi uma coisa muito natural, na verdade. A Carolina sabe de onde eu venho, já a conheço há mais de 10 anos e sempre lhe disse 'um dia tenho de fazer uma música para o meu bairro, para as minhas pessoas, para que elas sintam que eu continuo a ser delas, independentemente do meu caminho'. De um dia para o outro, a Carolina fez o single dela 'Não Me Importo' e escreveu 'Chelas'. É uma música muito especial.
A Sara tem três Coliseus esgotados e uma quarta data quase a esgotar. Como é que se reage a isso?
Ainda estou um bocadinho aqui a trabalhar esse processo. Acho que foi sempre o meu sonho - e acho que o de qualquer artista - chegar aos Coliseus. Pensei que ia fazer um e afinal já vou no quarto. É muito avassalador, uma grande responsabilidade, mas é também uma enorme alegria, sinto-me muito realizada.
O que é que o público pode esperar destes concertos?
Vão existir muitas surpresas. Vou apresentar o meu novo álbum, mas não me posso esquecer dos trabalhos anteriores, porque tudo é uma história até chegar a este trabalho, que é a Sara de hoje em dia. Vai ser quase como um peça de teatro, por assim dizer, o espetáculo vai ser montado de forma que as pessoas me conheçam desde muito nova até aos dias de hoje. Vamos ter convidados especiais - que ainda não posso revelar - e algumas surpresas nos quatro Coliseus.
A sua tour vai passar pela Bélgica, onde fará sete concertos. O que é que a motivou a fazer tantos concertos lá?
Já fiz uma tour na Bélgica, que passou também pela Holanda. Não sei exatamente o porquê, mas tive grande adesão do público, acho que lá as pessoas gostam de me ouvir cantar.
E o público é maioritariamente português?
Não, na verdade são quase todos estrangeiros. Há muita procura pelo fado lá fora.
Como é que se explica o fado a um estrangeiro?
É difícil... nem a dona Amália [Rodrigues] sabia, eu também não vou saber! Mas acho que se tivesse de explicar, diria que é a alma portuguesa, uma carga muito forte de emoções. Há pessoas que, quando saem de um dos meus concertos, me dizem que sentiram coisas que nunca tinham sentido, o que é muito bom de se ouvir.
A fadista esteve à conversa numa entrevista na qual falou sobre a infância, revelou qual a colaboração mais especial que fez, com quem gostaria de gravar um tema brevemente, quem considera que seja o seu 'pai' no mundo da música, partilhando ainda como foi a experiência de ter sido mentora no programa de talentos da RTP, 'The Voice'.
Nasceu numa família em que o fado esteve sempre presente. Nunca pensou ser outra coisa?
Não. Eu canto desde pequenina, até em casa... então acho que era o meu destino. Sempre tive a oportunidade de cantar em várias casas de fado, sempre me dei com pessoas que cantavam e sempre fui muito ligada à música, por isso acho que se não fosse cantora teria uma profissão ligada à música, nunca iria fugir desta arte.
Tem alguma memória de infância ligada à música?
Quando a minha mãe cantava para mim. Mas não eram fados, eram coisas mais populares. Eu chorava muito a ouvi-la cantar e às vezes cantava com ela.
Já a cantar ao vivo, acho que a experiência que me marcou mais foi quando participei n' A Grande Noite do Fado', que me permitiu cantar num Coliseu. Foi espetacular.
A Sara já tem uma carreira consolidada. Começou a cantar muito nova, já tem álbuns lançados...
Não considero que seja uma grande carreira. Sinto que a comecei a partir do momento em que comecei a gravar os meus discos, já com alguma maturidade. Sinto que o meu caminho no fado até então - portanto até aos meus 22 anos - foi só um caminho que eu fui traçando. Considero que os álbuns é que vão marcando carreiras, portanto acho que ainda estou no início, ainda tenho muito que cantar e muito que dizer.
Considera que existiu um ponto de viragem na sua carreira? Quando?
Foi quando eu gravei o meu primeiro álbum, 'Sara Correia' [lançado em 2018]. Na verdade não é o meu primeiro álbum, porque eu gravei um trabalho com 14 anos, quando venci 'A Grande Noite do Fado, mas não considero que aquele disco tenha coisas minhas, eram só músicas que eu aprendi, não foi uma coisa estruturada, não tem muito a ver comigo. Gravei aquele álbum, porque na altura era esse o prémio para o vencedor. Se soubesse o que sei hoje não o teria feito.
Não teria gravado esse álbum? Porquê?
Era muito nova. Acho que no fado, principalmente, precisamos de viver, de ter histórias, e com 13 anos eu não sabia grande coisa da vida. Não tinha passado pelas histórias de amores e desamores, de ser livre, essas coisas que fazem com que o fado seja muito mais sentido. É nesse sentido que eu digo que não o teria feito. Não me arrependo, mas naquela altura ainda não tinha nada para dizer.
Todos os álbuns que gravou são diferentes e contam momentos distintos da sua vida. Em que é que este último, 'Liberdade' [lançado em 2023], difere dos outros?
Com os outros dois álbuns eu viajei imenso, cantei imenso lá fora, aprendi muita coisa, ouvi muita música, conheci muitos artistas e, na verdade, conheci-me cada vez mais. Agora, não sei se é por ter feito 30 anos, mas hoje sei o que é que quero para a minha vida, sem ter qualquer amarra ou querer agradar às outras pessoas. Quero agradar-me a mim e sentir-me bem comigo própria e acho que é por isso que este disco se chama 'Liberdade', exatamente porque me sinto livre, sinto que sou uma pessoa sem medo de nada. Não me levo muito a sério, levo o meu fado muito a sério e acho que isso é que faz com que consiga cantá-lo sem ser amargurada.
De todas as colaborações que fez, qual foi a que mais a marcou e porquê?
Acho que a música que cantei com o Pedro Abrunhosa, 'Que O Amor Te Salve Nesta Noite Escura' foi a mais especial pelo que representa, é uma música de apoio à Ucrânia. É marcante pelo facto de nos juntarmos por uma causa e acho que isso vai além da música. Eu conheci o Pedro - e ele vai rir-se disto - mas sinto que ele é quase um pai para mim na música. É uma pessoa que me ajuda muito, que me ensinou muito dentro do estúdio e eu adoro o trabalho dele. Acho que foi um projeto muito especial e acredito que as pessoas sentiram isso também, que é o mais importante.
Com quem gostaria de gravar um tema nos próximos tempos?
Com o Sam The Kid.
É um estilo de música totalmente diferente.
Sim, é verdade, mas eu cresci com o hip hop do meu lado também. Além disso, o Sam é meu vizinho, eu cresci a ouvi-lo. Também gosto muito de Slow J. Gostava muito de fazer coisas que não tivessem de ser só dentro do fado, algo que me permitisse levar o fado para dentro de outra música. Acho que é incrível e acaba sempre por resultar em sons completamente diferentes daquilo a que as pessoas estão habituadas.
No ano passado, a Sara foi mentora nos programas da RTP 'The Voice Gerações' e 'The Voice'. O que é que essas experiências lhe trouxeram de positivo?
Não é segredo para ninguém que eu não estou completamente tranquila em falar sobre mim e o 'The Voice' mudou a minha exposição pública. Isso para mim foi um desafio, porque eu tinha de mostrar às pessoas quem eu era, sem qualquer receio. Essa foi a primeira 'viragem' que o 'The Voice' me trouxe. Depois, foi o facto de a minha música ter chegado a muito mais gente. Foi muito gratificante nesse sentido, o 'The Voice' foi muito importante para mim e espero voltar.
Então tem planos de regressar ao programa?
Planos não sei, vontade sim. Não sei se consigo conciliar tudo, porque este é o ano em que tenho mais concertos agendados. Mas se me convidarem outra vez, vou aceitar.
Como é que se encara a responsabilidade de ser mentora de pessoas que estão a dar os primeiros passos na música?
A partir do momento em que ficamos com um concorrente é uma grande responsabilidade que cai em cima de nós, de conseguir levar aquela pessoa o mais longe possível, não só no programa, mas longe como artista, como cantor. Dar-lhes os melhores conselhos, tentar que eles se encontrem também. E depois tem muito que ver com a idade de cada um. Mas é um trabalho construtivo, cresci muito com eles. Acredito que [ser mentor] faz com que sejamos muito mais humanos.
'Chelas' é uma das suas músicas mais conhecidas, é especial por falar das suas raízes e foi escrita pela Carolina Deslandes. Como é que surgiu essa parceria?
Foi uma coisa muito natural, na verdade. A Carolina sabe de onde eu venho, já a conheço há mais de 10 anos e sempre lhe disse 'um dia tenho de fazer uma música para o meu bairro, para as minhas pessoas, para que elas sintam que eu continuo a ser delas, independentemente do meu caminho'. De um dia para o outro, a Carolina fez o single dela 'Não Me Importo' e escreveu 'Chelas'. É uma música muito especial.
A Sara tem três Coliseus esgotados e uma quarta data quase a esgotar. Como é que se reage a isso?
Ainda estou um bocadinho aqui a trabalhar esse processo. Acho que foi sempre o meu sonho - e acho que o de qualquer artista - chegar aos Coliseus. Pensei que ia fazer um e afinal já vou no quarto. É muito avassalador, uma grande responsabilidade, mas é também uma enorme alegria, sinto-me muito realizada.
O que é que o público pode esperar destes concertos?
Vão existir muitas surpresas. Vou apresentar o meu novo álbum, mas não me posso esquecer dos trabalhos anteriores, porque tudo é uma história até chegar a este trabalho, que é a Sara de hoje em dia. Vai ser quase como um peça de teatro, por assim dizer, o espetáculo vai ser montado de forma que as pessoas me conheçam desde muito nova até aos dias de hoje. Vamos ter convidados especiais - que ainda não posso revelar - e algumas surpresas nos quatro Coliseus.
A sua tour vai passar pela Bélgica, onde fará sete concertos. O que é que a motivou a fazer tantos concertos lá?
Já fiz uma tour na Bélgica, que passou também pela Holanda. Não sei exatamente o porquê, mas tive grande adesão do público, acho que lá as pessoas gostam de me ouvir cantar.
E o público é maioritariamente português?
Não, na verdade são quase todos estrangeiros. Há muita procura pelo fado lá fora.
Como é que se explica o fado a um estrangeiro?
É difícil... nem a dona Amália [Rodrigues] sabia, eu também não vou saber! Mas acho que se tivesse de explicar, diria que é a alma portuguesa, uma carga muito forte de emoções. Há pessoas que, quando saem de um dos meus concertos, me dizem que sentiram coisas que nunca tinham sentido, o que é muito bom de se ouvir.
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