Carlos Leitão - É tempo de ficar
Discos - Março 24, 2025

Carlos Leitão assume-o como o seu disco mais autobiográfico. Autor de todas as letras e de grande parte das melodias, o disco tem a transparência do que é e do que faz na música ao longo dos últimos 25 anos, tem a maturidade e a certeza do caminho, da coerência e do desafio constante que também o levou ao erro e à aprendizagem, solução salina para toda esta coisa de viver. Aos 45 anos, descobrimos-lhe os matizes como nunca, em “Ao que venho”, lugar vazio onde arrisca “despir-se” para dizer um poema seu pela primeira vez que é igualmente uma tocante declaração de interesses.
Assim começa a viagem. Com os seus parceiros de sempre, Henrique Leitão e Bruno Chaveiro (guitarra portuguesa), Luís Pontes (viola) e Carlos Menezes (baixo e contrabaixo), Carlos Leitão transporta-nos para o universo do fado sem filtros, intenso e doce, firme e carente, um jogo permanente de emoções que começa a solo, em “Armário Vazio”. Em “Adágio de um amor adolescente” os músicos Tomás Pimentel (fliscorne e trompete), Davide Zaccaria (violoncelo) e Flávio César Cardoso (violista) são convidados a assumir aquele que Carlos Leitão define como o mais belo dos temas escritos e compostos por si.
Entre amores e desamores, riscos, medos, partidas e regressos, a vida de Carlos Leitão desfia-se ao longo de todoo disco, até ao último tema que dá título ao disco, e para o qual Carlos convoca a singeleza da música cabo-verdianapara se despedir. Arriscou e compôs a sua primeira morna, Tempo de ficar, e partilha-a com a respeitada Nancy Vieira e como músico Vaiss Dias, um dos nomes maiores da música de Cabo Verde, falecido recentemente.
Um dos singles escolhidos chama-se “Passeio dos tristes”, com música de Paulo Paz, e é uma sátira atual à realidade alheada em que todos vivemos, “uma crítica mordaz e irónica à sociedade que nos anda a deixar a nu algumas das questões que a desorganizam, muitas vezes infantilmente”, diz Carlos Leitão.
No seguimento, Pedro Joia é outro dos convidados do disco. A meias, Carlos e Pedro assinam “O último poema de amor ao meu país”, uma declaração de amor e de afastamento a Portugal, um testemunho de liberdade, de coração aberto, balanço feito entre o passado e o presente.
Em “Corrido daqui”, o fado tradicional ganha a expressão máxima do disco. Para o efeito, o cantautor junta-se a suaviola ao quarteto habitual e convida Custódio Castelo. Três guitarras portuguesas, duas violas e uma viola-baixo a tratarem a primeira de todas as melodias do fado com a autenticidade merecida, de forma crua, sem artifícios,apenas com a mais intensa verdade da raiz.
Quem está atento a Carlos Leitão percebe que o seu novo disco o entrega ao público, não de geração espontânea,mas como consequência de cada um dos seus discos anteriores. São 25 anos de dedicação à música e à escrita queo cantautor resume em “É tempo de ficar”. Carlos leva-nos a passear pela sua vida através da subtileza a que sempre nos habituou, desde o amor mais despido até aos prazeres da luta, de quando fica ou desiste, mas principalmente da firmeza com que decide não abalar da sua coerência enquanto artista e enquanto homem.
O tema “2013” marca o final de um ciclo da sua vida e o início do que o traz até estes dias. É um tema determinante no disco. Com o arranjo musical de Tomás Pimentel e abrilhantado pelo quarteto de cordas formadopor Ana Pereira (primeiro violino), José Pereira (segundo violino), Joana Cipriano (viola) e Marco Pereira(violoncelo), Carlos Leitão convida alguns dos seus amigos e familiares para cantarem consigo, e assume: “É aqui que a história (re)começa.