O fado no Brasil: a produção discográfica


E, nos anos 1930, ninguém registou tantos fados em discos no Brasil quanto dois portugueses: um Manuel (Monteiro) e um Joaquim (Pimentel). O ceptro do rei do fado pertence, sem dúvida, a Manuel Monteiro, que, quem diria, viraria verbete no Dicionário Houaiss/Ilustrado: Música Popular Brasileira (ALBIN, 2006, p. 494).
Nascido em Cimbres, Portugal, em 1909, ainda adolescente ele se transferiu, com sua família, para o Rio de Janeiro, onde morreu em 1990. Sua estreia na vida artística ocorreu no início da década de 1930 no “Programa Luso-brasileiro”, da Rádio Educadora.
Naqueles tempos não eram raros os programas do tipo, dirigidos em particular à colónia portuguesa radicada na capital da República. A carreira do cantor (excepcionalmente compositor) descolou sobretudo entre 1933 e 1935, a julgar pela quantidade de fonogramas gravados nesses três anos, 37 ao todo. Reconhecido como o primeiro intérprete lusitano a ser bem-sucedido em terras brasileiras.
No rol de géneros que compunham o cardápio musical de Manuel Monteiro sobressaíam os fados, seguidos de viras e marchas, sem falar de canções carnavalescas da autoria de compositores nacionais. Seu primeiro grande sucesso foi o fado ‘Santa Cruz’” (ALBIN, 2006, p. 494), lançado em 1933. Manuel se converteu numa referência, nada desprezível, no cenário artístico brasileiro. Prova disso é que, em 1935, foi uma das estrelas do filme musical Alô, alô, Brasil, dividindo espaço, no elenco, com pesos-pesados da música popular brasileira, como Carmen Miranda, Francisco Alves, Sílvio Caldas, Mário Reis, Ari Barroso, Almirante, Custódio Mesquita e Aurora Miranda.
Por sinal, o cartaz desse filme anunciava que dele “fazem parte os melhores elementos artísticos da rádio”. E Manuel Monteiro, impulsionado pelo filme, emplacou com sucesso retumbante, a marcha “Salada portuguesa”, mais conhecida pelo nome de “Caninha verde”.
Na contabilização que efectuei dos fados transpostos para os discos entre 1930 e 1939, eles alcançaram a cifra de 172 fonogramas, considerando-se a identificação dos géneros musicais nas etiquetas dos 78 rpm. Aí predominava, com larga folga, a nomenclatura fado, se bem que, vez por outra, surgiam as denominações fado-canção (6) e fado-marcha (3).
Na cabeça da fila dos fadistas estava Manuel Monteiro, com 45 fonogramas, vindo a seguir Joaquim Pimentel, intérprete e compositor eventual (com 29), cuja carreira no mundo dos discos deslanchou entre 1935 e 1939. No terceiro posto (com 20) despontava José Lemos, enquanto cabia à cantora (compositora bissexta) Isalinda Seramota (com 15) o quarto lugar.
Uma imensa gama de cantores, cantoras, grupos musicais e instrumentistas (vários deles ancorados na guitarra, instrumento tradicional usado no fado) completava essa relação. Listados aqui em ordem alfabética, eram eles:
A. F. da Conceição, Amélia Borges Rodrigues, Ana de Albuquerque Melo, Anita Gonçalves, Antônio Lopes, Artur Castro, Benício Barbosa, Berta Cardoso, Carlos Campos, Céu da Câmara, Desafiadores do Norte, Esmeralda Ferreira, Eugênio Noronha, Fábia Gil, Francisco Pezzi, H. da Conceição, Henrique Costa, Henrique Xavier Pinheiro, Horácio Rodrigues, Ivone Guedes, João Fernandes, Joaquim Seabra, José Galante, Maria Albertina, Maria do Carmo, Mirandella, Nicolau Gomes Cunha, Santos Carvalho, Stella Gil e Zaíra de Oliveira.
Disso tudo decorre que o fado nem longe passava em brancas nuvens na produção fonográfica do Brasil.