«A Bruxa de Pinho»
Então, sob a euforia da libertação, imagine-se a ambiência da capital portuguesa naquela conturbada época com a soldadesca inglesa irmanada na população alfacinha, fruindo extravagantes noitadas por prostíbulos e tavernas.
Num desses vertiginosos convívios, entre fumarada, vinho, homens em delírio e mulheres de amor-fácil, estaria um militar inglês a animar o serão, dedilhando com mestria um mandolim, o que terá suscitado particular curiosidade num dos convivas, português, também tocador de instrumentos de corda e benquisto marceneiro de profissão. Naturalmente, logo que surgiu a oportunidade, pediu ao soldado inglês para experimentar o instrumento.
Daquela noite bem passada terá ficado ao luso folgazão o desejo de também possuir um mandolim, assaz impressionado com os aplausos que a sua actuação mereceu.
Bem, o resto desta imaginada e singela história prossegue, em face da afamada Guitarra Portuguesa, em cinco sextilhas, que procuram música própria. Quiçá o Custódio Castelo, com quem já tenho uma parceria musical através do Nuno de Aguiar sob o título "O novo Bairro Alto", por feliz coincidência venha a compor uma música adequada a estes versos.
A GUITARRA PORTUGUESA
Matutando, cá pra mim,
terá sido o mandolim
que inspirou concerteza
o artista português
que ao acaso um dia fez
a guitarra portuguesa.
Ao redor de lauta mesa
uma tertúlia burguesa
vejo em grande diversão
e lá no meio abancado
em exímio dedilhado
alguém anima a sessão.
Recostado ao balcão,
um mestre na profissão,
marceneiro afamado,
observa muito atento
as formas ao instrumento
por seu som maravilhado.
Mais tarde, assaz devotado,
sem modelo e isolado
trabalhou dias a eito;
cortou, lixou e poliu
e assim que concluiu
pasmou do que tinha feito.
Encostando a seu peito
o instrumento e com jeito
ao tocá-lo com firmeza,
na emoção que sentiu
foi o primeiro que ouviu
a guitarra portuguesa!...